terça-feira, 19 de junho de 2012

De como latinizar um grupo de doidos. Parte I

             De vez em quando uma onda se ergue no mundo da internet. Não abala o tráfego de informações, não tranca os computadores, mas deixa ocupados e felizes uma dúzia de pessoas.
             Esta onda, que atende pelo endereço “Clube de Leitura Ex- Libris”, é conhecida por muito poucos, mas é um dos programas mais legais da cidade. Alguns mais falantes, outros mais calados.

             A marola pode começar com um e-mail simples assim:

             “Feliz Aniversário, SHUKRAM

              A resposta com os agradecimentos de praxe encerrava com uma observação: “acredito que esta palavra seja uma daquelas que dizem tudo com poucas letras”.

              Pronto, a onda toma corpo!

              A ela seguiram-se outras: SALAMALECO, SAHTEIN, SHUKRAM.
              
              Ao que outros responderam: Hare Krisnha, Hare, Hare! e um brasileiríssimo SARAVÁ!

               O vento aumenta sobre as águas e certa professora manda: AD VITAM AETERNAM!!!!!
               
               Prontamente rebatida com ROMA LOCUTA CAUSA FINITA.

               E a professora responde: MAGISTER DIXIT.
               
               Uma terceira voz entra na conversa, a da escritora: A BONIS BONA DISCE.

               A professora estava inspirada e lavrou: MAGISTER DIXIT

               E a escritora: CEPISTI VOLUCRS, ALIUS SED TETENDIT.

               Aparece a voz masculina: SATOR AREPO TENET OPERA ROTAS e a conversa imediatamente toma o rumo dos Palíndromos com CEPISTI VOLUCRES, ALIUS SED RETE TETENDIT.
               
               O Palíndromo, quase um tsunami, provoca logo o e-mail, da psicóloga/escritora/professora:

               “Um palíndromo é uma frase que pode ser lida tanto da esquerda para a direita quanto da direita para a esquerda. O interessante deste palíndromo é que, além disso, as primeiras letras de cada palavra formam a primeira palavra, as segundas letras de cada palavra formam a segunda palavra, e assim vai.
Desta forma, organizado em um quadrado, é também possível ler a mesma frase verticalmente. Este palíndromo é mundialmente conhecido como o Quadrado de Sator:



O registro mais antigo deste palíndromo foi encontrado nas ruínas de Herculano, cidade soterrada sobre as cinzas do Monte Vesúvio no ano 79.
Como bem notado pelo Caio, o Quadrado de Sator também é associado ao cristianismo, à numerologia e à magia, mas pelo bem da sanidade pública, prefiro ressaltar o palíndromo apenas pela sua curiosidade linguística.

Isso me lembra também uma lição que envolve o soneto 129 de Shakespeare, que foi apresentado e explicado esses dias em uma das aulas da Oficina de Textos Literários que estou cursando:

The expense of spirit in a waste of shame
Is lust in action: and till action, lust
Is perjured, murderous, bloody, full of blame,
Savage, extreme, rude, cruel, not to trust;
Enjoyed no sooner but despised straight;
Past reason hunted; and no sooner had,
Past reason hated, as a swallowed bait,
On purpose laid to make the taker mad.
Mad in pursuit and in possession so;
Had, having, and in quest to have extreme;
A bliss in proof, and proved, a very woe;
Before, a joy proposed; behind a dream.
All this the world well knows; yet none knows well
To shun the heaven that leads men to this hell.

Roman Jakobson notou que no primeiro verso do soneto, as palavras shame, expense e spirit formam a pronúncia do nome Shakespeare. O pensador russo também percebeu que se trocarmos well por Will (diminutivo de Willian) nos últimos dois versos conseguimos uma nova leitura do soneto.
Moral da história: palíndromos e anagramas são coisas para doidões! (sic)
               E eis que surge, em grande estilo, claro, Camões a queixar-se do mundo

LABIRINTO
Corre sem vela e sem leme
o tempo desordenado,
dum grande vento levado;
o que perigo não teme
é de pouco exprimentado.

As rédeas trazem na mão
os que rédeas não tiveram:
vendo quando mal fizeram
a cobiça e ambição
disfarçados se acolheram.

A nau que se vai perder
destrue mil esperanças;
vejo o mau que vem a ter;
vejo perigos correr
quem não cuida que há mudanças.

Os que nunca sem sela andaram
na sela postos se vêm:
de fazer mal não deixaram;
de demónio hábito têm
os que o justo profanaram.

Que poderá vir a ser
o mal nunca refreado?
Anda, por certo, enganado
aquele que quer valer,
levando o caminho errado.

É para os bons confusão
ver que os maus prevaleceram;
posto que se detiveram
com esta simulação,
sempre castigos tiveram.

Não porque governe o leme
em mar envolto e turbado,
quem tem seu rumo mudado,
se perece, grita e geme
em tempo desordenado.

Terem justo galardão
e dor dos que mereceram,
sempre castigos tiveram
sem nenhüa redenção,
posto que se detiveram.

Na tormenta, se vier,
desespere na bonança
quem manhas não sabe ter.
Sem que lhe valha gemer
verá falsar a balança.

Os que nunca trabalharam,
tendo o que lhes não convém,
se ao inocente enganaram
perderão o eterno bem
se do mal não se apartaram.

                 A este ponto da conversa, a que se diz chefe (?) do bando e está num “dolce far niente” pelo velho mundo, que de tão velho ainda capengueia na internet, pede encarecidamente que se faça um breve apanhado das conversas com as devidas traduções. Imediatamente a Monitora designada como correspondente paulista, toma do teclado e manda:

AD VITAM AETERNAM-Para sempre
ROMA LOCUTA CAUSA FINITA- Roma falou, a causa está terminada.
A BONIS BONA DISCE – Junta-te aos bons e serás um deles.
MAGISTER DIXIT - O mestre o disse.
CEPISTI VOLUCRES, ALIUS SED RETE TETENDIT – Um levanta a caça e outro a mata.
ALEA JACTA EST - A sorte (os dados) está lançada.
DOCTUS CUM LIBRO – Sábios com livro.
CARPE DIEM – Aproveite o momento, colha o dia.
FIAT LUX – Faça-se a luz
DURA LEX SED LEX – A lei é dura, mas é a lei.

               Frente a tudo isto até os mais silenciosos ganham voz, elogiam a rota da conversa, a erudição dos que até agora se apresentaram com o latim polidíssimo e lembrando a forma descompromissada como tudo começou lá pelos idos de 2009, tecem loas ao clubinho.

               A amizade e a sinceridade são imensas neste grupo e a professora declara, não envergonhada, que as citações foram copiadas (sic) de um dicionário de latim,artimanha desenvolvida e aperfeiçoada os adolescentes seus alunos, vejam só! E manda mais uma: DOCTUS CUM LIBRO.

               A monitora, tocada pela confissão da professora, admite que puxava o saco do professor de latim, mas que conversava demais nas aulas. Arrependeu-se tarde! Mas guardou o dicionário e procura lá: DOCTUS CUM GOOGLE.

               Outra diplomada em letras desabafa:

“Não conversei durantes as aulas de Latim 1 e 2 na PUC-RJ com o inesquecível Junito Brandão e, até onde me recordo, tirava notas altas nas traduções dos textos que ele trazia para as provas... O revoltante é que parece que isso foi em minha outra vida... Tudo é uma névoa difusa... e não me lembro de mais de nada! 
Para a nossa sorte (e alguma desventura, já que o estímulo ao esquecimento se tornou ainda maior), a Wikipédia e o Google vieram preencher esses enormes espaços..." 

               A amiga que mandou a primeira expressão diz que precisa urgente do dicionário de cabeça só lhe vem: ALEA JACT EST! e FIAT LUX!

               E o desnorteio continua, com parabéns atrasados pelos aniversários passados e não lembrados e como um Quadrado de Sator, se materializa uma tabela de aniversários. A tabela, carinhosamente preparada não agradou a todos, eta povo exigente, e se pede reformulação. Prontamente atendida com um pequeno adendo no final:

              “Como se diz em latim: "a pessoa não pode oferecer a mão que neguinho logo quer o pé"??! e é prontamente traduzida: Digitum stulto ne permittas!” 
               
              Mas há as agradecidas que assim respondem: Lita, obrigatorium.  Trabalhus made well! 

              E as contribuições não param de chegar:

- “lembro o livro escrito pelo Paulo Rónai, Não Perca o seu Latim, que tem centenas de citações, provérbios e uma pequena gramática no fim para quem se atrever a recordar o que aprendeu no ginásio”... correndo o risco de um fim incerto, segundo o Beto. E também do Pedro Nava que, no seu Chão de Ferro, ao contar das aulas de latim no internato do Pedro II, conta de uma frase maliciosa que os meninos aprendiam: EAMOS AD MONTEM CUM PORIBUS NOSTRI FODERE PUTAE,que não quer dizer o que vocês estão pensando não, mas, inocentemente, vamos ao monte com nossos escravos cavar poços. Pois é...

- COGITO ERGO SUM, NIHIL OBSTAT, AMOR OMNIA VINCIT, POST TENEBRAS LUX,

- a / a / an / ae / ae / as
ae / ae / as / arun / is / is
us / ae / un / i / o / os
““... declinações, nem sei mais como se escreve. Eu sou antiga, dá época que ensinavam latim na escola (Pedro II - Humaitá). Só tirava 10, adorava, pois decorava até os textos. É claro, que já não me lembro de mais nenhum - adoraria 'declamar' para vocês..!!!

- Aniversarium Sérgius – 21/12.

- NULLA DIES SINE LINEA.

               E a pá de cal: “parodiando o Descartes: COGITO ERGO ABDICO: penso e logo desisto”!

               E, nova solicitação de resumo do que foi dito,prontamente atendida:

POST TENEBRAS LUX- luz depois das trevas
NULLA DIES SINE LINEA - nenhum dia sem uma linha, nenhum dia sem estudar.
SURSUM CORDA! - corações ao alto!
AGERE, NON LOQUI – Atos, não palavras.
DIGITUM STULTO NE PERMITTAS – Dá-se o pé e ele quer a mão
COGITO ERGO SUM – Penso, logo existo (Descartes).
AMOR OMNIA VINCIT – O amor vence tudo, tudo suporta (Virgílio).
NIHIL OBSTAT – Nada impede

              Coincidências existem, é claro, sem elas o clubinho não teria juntado gente tão bacana e para a encerrar em grande estilo todas as citações, a chefe (?) que continua passeando se depara com uma máxima e manda:


ORQUID SOLUTES EST BEATIUS CURIS MENS ONUS REPOINT AC PEREGRINE LABORE FESSI VENIMUS LAREM AD NOSTRUM DESITERATOSQUE ACQUIESCIMIUS LECTO,


que numa tradução à la Bangu: 


o que é melhor, depois do trabalho feito, com a mente livre de todas as preocupações e cansada do esforço que se fez em nome dos outros, do que retornar à casa e deitar-se na cama que tanto se deseja. sugestão de acréscimo: e no dia seguinte ir ao clubinho.


A chefia cita a fonte: Catulo,poeta romano,e pede que por favor não confundam com Catulo da Paixão Cearense.


Ufa!





A parte II será dedicada a Santo Antônio, aos amores e a velhice. Não dá para acompanhar tudo de uma vez só. 

sábado, 3 de março de 2012

Curta metragem para o fim de semana

Terezinha manda o link do "Os fantásticos livros voadores do Senhor Lessmore" - a animação vencedora do Oscar 2012.

É fantástica!.
Oscar merecidíssimo.


Thank you Terezinha, sempre procurando coisas novas para nos alegrar.

sexta-feira, 2 de março de 2012

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Macau e Camões Parte 2



                Ao redor da gruta, no lugar mais alto do Jardim à volta de uma praça estão todas estas homenagens à Camões.
Se não conseguirem ler eu mando em foto por e-mail.











Esta é a vista de Macau pelos olhos de Camões. E pelos meus também.



 










  












































Acho que o vulgo ignaro sou eu.
 




  


























Em meio, talvez alheias, a toda esta poesia as velhinhas dançavam. Acho que depois iam ver uma peça de um tal de Oscar Wilde.




























































































































































































































quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Macau e Camões

Para o clubinho querido,

Seguindo os passos de Camões em Macau, começando pela praça

que dá acesso ao Jardim Público onde nesta gruta dizem que nosso querido gênio escreveu Os Lusíadas 






Para nós parece muito, e é, mas os daqui, ou melhor, de lá, me parecem que não estão nem aí.
De português, só as placas traduzidas, pois é língua oficial como o chinês, e os pastéis de Belém.
Algumas misturas estranhas de português com chinês na fisionomia, que particularmente achei a nossa de negro e índio muito mais interessante.

Em outra postagem mando mais do jardim.
Saudades...




terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Charles Dickens

O aniversariante de hoje é Charles Dickens!
Olhem que lindo o “doodle” do google.
Happy birthday, dear friend!

Cultura inútil da Wikipedia: Um Doodle é um tipo de esboço de algum desenho realizado quando uma pessoa está distraída ou ocupada. Doodles são desenhos simples que podem ter significado concreto de representação ou simplesmente representar formas abstratas.

Muitos exemplos podem ser encontrados em cadernos escolares, muitas vezes à margem, desenhados por alunos distraídos ou desinteressados durante uma aula.

Geralmente doodles incluem caricuturas de professores ou colegas de escola, pessoas famosas ou personagens de desenhos animados, seres fictícios, paisagens, formas geométricas, banners com legendas e animações feitas desenhando-se uma seqüência de cenas em várias páginas de um livro ou caderno.

Etimologia: A palavra americana doodle surgiu por volta do século XVII para significar um tolo ou simplório.  Variantes da etimologia alemã incluem Dudeltopf, Dudentopf, Dudenkopf, Dude, Dudeldopp e Dödel.

O que significa "tolo, simplório" destina-se no título da canção "Yankee Doodle", originalmente cantada por tropas coloniais britânicas antes da Guerra Revolucionária Americana. Esta é também a origem do verbo em inglês com o mesmo nome, no início do século XVIII: doodle, que significa "fazer de bobo". O significado moderno surgiu na década de 1930 a partir deste significado ou a partir do verbo "ociosidade", que desde o século XVII teve o significado de perder tempo ou de ser preguiçoso.

Efeitos na memória: De acordo com um estudo publicado pelo Applied Cognitive Psychology, criar doodles ajuda a memória de uma pessoa de forma significativa. O estudo foi feito pelo professor Jackie Andrade, da Faculdade de Psicologia da Universidade de Plymouth. [

Monólogo de Orfeu

Contribuição do Beto que lembrou deste texto ao ler o texto do Aníbal MAchado: A Morte da Porta-Bandeira.

Monólogo de Orfeu - Vinícius de Moraes

Mulher mais adorada!
Agora que não estás,
deixa que rompa o meu peito em soluços
Te enrustiste em minha vida,
e cada hora que passa
É mais por que te amar
a hora derrama o seu óleo de amor em mim, amada.
E sabes de uma coisa?
Cada vez que o sofrimento vem,
essa vontade de estar perto, se longe
ou estar mais perto se perto
Que é que eu sei?
Este sentir-se fraco,
o peito extravasado
o mel correndo,
essa incapacidade de me sentir mais eu, Orfeu;
Tudo isso que é bem capaz
de confundir o espírito de um homem.
Nada disso tem importância
Quando tu chegas com essa charla antiga,
esse contentamento, esse corpo
E me dizes essas coisas
que me dão essa força, esse orgulho de rei.
Ah, minha Eurídice
Meu verso, meu silêncio, minha música.
Nunca fujas de mim.
Sem ti, sou nada.
Sou coisa sem razão, jogada, sou pedra rolada.
Orfeu menos Eurídice: coisa incompreensível!
A existência sem ti é como olhar para um relógio
Só com o ponteiro dos minutos.
Tu és a hora, és o que dá sentido
E direção ao tempo,
minha amiga mais querida!
Qual mãe, qual pai, qual nada!
A beleza da vida és tu, amada
Milhões amada! Ah! Criatura!
Quem poderia pensar que Orfeu,
Orfeu cujo violão é a vida da cidade
E cuja fala, como o vento à flor
Despetala as mulheres -
que ele, Orfeu,
Ficasse assim rendido aos teus encantos?
Mulata, pele escura, dente branco
Vai teu caminho
que eu vou te seguindo no pensamento
e aqui me deixo rente quando voltares,
pela lua cheia
Para os braços sem fim do teu amigo
Vai tua vida, pássaro contente
Vai tua vida que estarei contigo.